11 maio 2014

Um conto de mãe e filha


"Era sábado e já acordou com a cabeça a mil. Pensava numa forma de presentar a sua mãe. Mas seu porquinho estava vazio, sua criatividade pareceu se esvair. As palavras sumiram! Nada parecia o suficiente, nada parecia ser do tamanho que ela merecia. Sua mãe sempre foi a sua joia. Aquela flor única que nasce no jardim. Aquela risquinho de sol num céu nublado. O último pedaço da sobremesa. O último gole do vinho. O pão de queijo saindo do forno. A mão que se precisa pra se sustentar. Sua mãe sempre foi aquele anjo que nunca desaparece. Aquele bote salva-vidas quando ela precisa de resgate. Sempre foi aquela alegria quando era do sorriso dela que sentia falta. Ou a paz, quando era sossego que ela procurava.

A mãe dela sempre foi mais que isso. Era aquele restinho de esperança que a vida estava pedindo. Era a saudade transformada em amor. Era o diário sem chave - porque simplesmente não era necessário lacrar. Sempre foi o ídolo que ela nunca soube dizer qual era. O orgulho que ela tem desde que nasceu. Aquele amor verdadeiro que ela acha que não existe e não se dá conta que está bem do seu ladinho. Sua mãe sempre foi aquela que se desdobrava inteira para estar nos eventos escolares, para presentear-lhe com o que queria de verdade. Para vê-la feliz. Sua mãe era a aquela que não a abandonava nunca, mesmo no erro, estava lá. Para consertá-lo, para ensiná-la a fazer o correto, para dar alguma bronca e, com toda certeza, pra amparar-lhe. Sua mãe era aquela que todo mundo queria ter no mundo, mas só ela e sua irmã a tinha. 

A mãe dessa menina era incrível. Trabalhava dia e noite pra dar-lhes conforto. Para que vivessem da melhor forma possível. O que ela não sabia era que o amor bastava. Que a companhia dela era a melhor do mundo. E que isso dinheiro nenhum no mundo comprava. Não há vale de troca. Nada substitui essa figura que chamamos de mãe. 

Chegou a noite. Ela foi dormir um pouco preocupada. Dia seguinte seria dia das mães e nada havia comprado para presentear a sua. Deitou, pensou, pensou, e nada passava pela sua cabeça. Sequer uma fagulha de criatividade. Mudou o lado da cama, se mexeu o quanto pôde, apagou e acendeu a luz, escreveu algumas linhas, e nada. Nada parecia ser o suficiente para alguém tão especial. Alguém que, por mais clichê que pareça, a carregou nove meses na barriga, e mais 19 anos ao lado. Alguém que sempre esteve de braços abertos para acolher ou comemorar. Alguém que nunca a deixou abater por perda nenhuma. Alguém que estava ali. E sempre esteve. E vai estar a cada segundo.

Dormiu. Sem querer, caiu no sono. Acordaria no outro dia com as mãos vazias, a boca seca e o coração explodindo de decepção de si mesma. Teve um sonho perturbador. Mal pregou os olhos. Acordou de madrugada. Leu algumas páginas de um livro. E amanheceu. Com os olhos abertos desde cedo, caminhou até a sala. As mãos para trás, a cabeça baixa e uma lágrima pronta pra cair. Balbuciou um "bom dia" e antes de acrescentar qualquer palavra, sua mãe falou:

- O primeiro "bom dia" do meu dia ser seu, é o melhor presente que uma mãe poderia ganhar.

Sem palavras para responder o que, pra ela, também havia sido um presente, a menina a abraçou. Mas a abraçou tão forte que sentiu o coração bater do outro lado. Foi o dia das mães mais sincero das duas. Foi o abraço mais inesquecível que compartilharam. E foi o dia que nenhuma delas irá esquecer. A filha, pela mãe surpreendente que tem em casa. A mãe, pela filha maravilhosa que colocou no mundo."

Dani Fechine

O texto é completamente ficcional. Porém, essa mãe incrível a qual descrevi é a minha. Essa pérola que eu guardo comigo em todos os lugares que vou. Essa pessoa incrível, guerreira, determinada e firme. Essa mãe inigualável é minha. E ela é eterna. É insubstituível. E eu amo mais que qualquer coisa nesse mundo. Mãe, guarda essas palavras, é a minha forma de eternizar o que meu coração grita por dentro. Amo você! 

04 maio 2014

Carta do futuro


“Venho, por meio desta, informar que uma mudança drástica aconteceu no nosso mundo. Logo após a implosão que sucedeu por aqui algo novo surgiu. Um novo planeta renasceu, com novas árvores, novas terras, novos mares, novo céu, novas pessoas. Esse é o ponto principal. Novas pessoas. Caro amigo, sei que não lerá esta carta, mas faço questão de relatar para as gerações futuras sobre o futuro grandioso que o nosso passado obteve e ninguém melhor do que você para ser o meu destinatário.


Pois é, você é uma das poucas coisas do mundo velho que ainda restam nesse paraíso, porque permanece por todos os lugares. Hoje saí pra trabalhar a pé, para sentir um pouco a brisa fria da manhã de junho e, algo incrível aconteceu: durante os 15 minutos de caminhada até o escritório, recebi cinco cumprimentos de bom dia. Agora todos se cumprimentam na rua, mesmo que não se conheçam. Acenam, sorriem e as vezes até desejam coisas boas pra gente, sem se importarem com quem estão falando. Chamaram essa prática de educação. Achei fantástico e estão até ensinando nas escolas.

Lembra-se dos noticiários sanguinários que você detestava? Faliram. Pouco se vê de violência por aqui. Todos me parecem humanos, diferentemente do mundo antigo, onde a briga diária por bens materiais, pela vida e pela paz alheia, era pauta principal de quase todos os jornais da cidade. Agora a gente sai pra beber um vinho durante a noite e não nos assusta mais deixar o carro em casa e caminhar um pouco até o bar. Voltamos alegres, pisando as poças d’água, sem disparar o coração ou sermos surpreendidos com algum assalto a mão armada. E quando raramente isso acontece, esses cidadãos um pouco desvirtuados das coisas boas que a vida pode nos dar, são reabilitados em casas especializadas nesse tipo de problema. Recebem a chance de voltar ao mercado de trabalho e passam a viver novamente como nós. Quem diria, hein, que essa paz seria possível? O segredo foi investir na prevenção do mal. Remediar se tornou obsoleto.

Uma novidade digna de comemoração é que preconceito pouco se conhece por essas bandas de cá. Comemos bananas e ninguém nos chama de macaco, por exemplo. Não somos todos iguais, mas nos respeitamos igualmente. Não temos a mesma origem, mas somos um mesmo povo. Não fomos criados da mesma forma, mas lutamos para uma mesma causa. Não gostamos das mesmas coisas, mas compartilhamos nossos saberes. Não nos ensinaram como seguir, nós simplesmente seguimos. E fizemos o certo.

Por falar nisso, aqui sobra honestidade. Se esse mundo para o qual escrevo ainda houvesse salvação, mandaria um pouco dentro desse envelope. Quem não tem nada, o pouco já é suficiente. Políticos a gente também tem, sabe? Mas como diria Thomas Hobbes, esse governo é um mal necessário para conter o caos. Alguém tinha que pôr ordem nisso tudo e, por incrível que pareça, está dando certo. Educação não nos falta, meu amigo. As crianças estudam sustentadas pelo governo e estas são as melhores escolas do nosso país. Há briga para conseguir matrícula. Abastados ou não, todos frequentam o mesmo colégio. A saúde gratuita também virou acesso fácil e eficiente. Os médicos aqui gostam de trabalhar e o fazem por amor. Nenhum cidadão morre em cima de uma maca no corredor da emergência. Nenhum idoso perde sua vida por recusa de atendimento. Somos todos prestativos. E fazemos isso porque queremos o mesmo em troca.

E por fim, meu caro, aqui o respeito é mútuo. Das crianças aos idosos, todos fazem parte de uma mesma massa regida pela educação. Alguns ainda não descobriram seus destinos, mas todos sabem que a base para construí-los está no que plantamos por aqui: respeito. A dignidade, a coragem de seguir em frente e o sucesso da realização nós cultivamos pouco a pouco e acreditamos que no fim seremos cada vez melhores. É com uma saudade imensa de você que me despeço de uma vez por todas. O mundo que ficou não mais nos pertence e dele não queremos nem uma folha para plantar por aqui. O mal se dissemina com uma frequência maior que o bem e é isso o que menos queremos no nosso planeta que não mais se chama Terra. Um abraço saudoso e repleto de boas energias. Quem sabe não nos encontremos em outro mundo.”

Dani Fechine