02 maio 2015

Meu cárcere é minha escrita



Eu não queria ser dependente da escrita. Escrever por necessidade é depender de si mesmo, depende da sua coragem, da sua disposição e até da sua energia. É depender de que você não vai chorar ou, simplesmente, também não vai largar o barco. Eu não queria viver presa na minha própria imaginação.

Quando falo desse cárcere, é apenas no sentido do desabafo. Do jogar pra fora. Deixar no lixo. Falo do escrever para não implodir. Até porque, se eu dependesse da escrita para viver, não tenho dúvidas que a minha vida seria exatamente como esperei que fosse: frenética, multicor e sem monotonia. Mas falo da incapacidade de falar. De explodir com as palavras verbais, de gesticular, chorar no ombro do outro. Escrever para não explodir, isso eu não consigo. 

Não. Eu não queria estar presa na minha escrita. Não queria fazer dela o meu único escape de leveza. Embora me sinta muito bem quando coloco o último ponto final – e seria um grande egoísmo se eu não assumisse isso – não gostaria de ter que recorrer sempre ao papel, ao computador, ao celular, ou que quer que seja material, físico, para que eu me libertasse de mim mesma. Não queria depender da minha própria liberdade literária para sentir-me livre. 

É difícil estar presa a si mesma. É difícil confiar apenas numa folha de papel em branco. E, aliviando os mais próximos, posso dizer que a questão da confiabilidade é o mínimo dos problemas. O peso mesmo está comigo. Está no fato de achar que ninguém merece ouvir os meus problemas, as minhas queixas, os meus lamentos ou até as minhas alegrias – e não merecem mesmo. Assim como eu, cada ser humano tem a sua vida pra cuidar, pra resolver, pra se preocupar, pra se alegrar, pra se queixar, pra fazer o que bem entender com ela. Não é dever meu ocupá-la com mais uma.

Então, o que faço – e não estou dizendo que isso é o certo, até porque, nesse caso, certo/errado é um contexto relativo – é resolver comigo mesma. As vezes é até mais rápido e sim, sempre dá um resultado mais satisfatório. Infelizmente sou do tipo de pessoa que não gosta de conselho, quiçá pitaco. Se, eventualmente, desabafo com alguém da espécie humana, deixo um recado no final: não precisa dizer nada, eu só precisava falar.

E não deixa de ser uma escrita às avessas. O papel, por exemplo, não me responde. Eu me auto medico. Quando faço esse apelo a algum amigo (a) é como se o papel estivesse em minha frente – e, claro, isso também não é um menosprezo. É que a necessidade de liberar o que tem dentro de mim com palavras, é muito maior do que com uma conversa. Dependo muito mais de mim, do que da escuta do outro. 

Talvez seja uma breve avaliação que, dessa forma, consigo fazer do meu problema. Escrevendo – e isso falo com propriedade – tudo clareia um pouco. É possível até recorrer aos escritos e avaliar melhor a sua fúria de palavras. Aquele emaranhado de frases, muitas vezes desconexas, deve dizer alguma coisa. E olha que incrível: é você mesmo que está dizendo isso, involuntariamente. 

Não é por outro motivo, é justamente por esse, que agora eu termino esse texto. Pela precisão de expor essa necessidade infeliz de mim mesma. Do papel. Da escrita. Das palavras. Da literatura. Penso que nunca conseguirei me distanciar disso -  e não quero. Escrever é o meu carma e, ao mesmo tempo, minha sorte, meu destino. Escrever movimenta: a mente, o coração, a razão e a emoção. É o calabouço com o maior número de respostas. Eu não queria necessitar da minha escrita para não implodir, mas que já que é assim, então coloco o ponto final nesse texto. Desabei intrinsecamente. E sou tão mal agradecida que escrevo um texto reclamando dessa solução infalível que é desabafar ao papel. 

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