Ontem fui dormir e era dia do escritor. Hoje eu acordei e é dia da avó. Ontem ela me daria os parabéns sem ligar pra audácia que é me chamar de escritora. Ficaria feliz com os meus avanços e as minhas conquistas com as letrinhas. Hoje eu escreveria um cartão enorme pra ela, com minha letra uma pouco desnivelada e com poemas procurados no Google (porque minha imaginação sempre se esvai quando penso nela). Eu chegaria na cozinha devagar, você estaria mexendo alguma panela no fogão e eu ficaria em pé, atrás de você, esperando a surpresa acontecer. Você então viraria e eu diria toda envergonhada:
“Feliz dia da avó, vó.”
E te entregaria o cartão, junto com um abraço apertado e um beijo estalado. Você iria me responder, brincando com os fonemas, do jeito de sempre:
“Obrigada, obrigada, obrigada.”
O dia de hoje merecia flores, vó. Merecia um buquê de vermelhas enfeitando a tua sala e fazendo brilhar teus olhos. Flores sempre foi a sua maior paixão. Um encantamento que eu nunca vi maior. O dia de hoje merecia presença. Merecia você sentada aqui, na minha frente, enquanto eu te escrevo. Merecia você derramar algumas lágrimas ao ouvir minha mãe ler meu texto pra você – mesmo que não fosse tão emocionante assim. Merecia te ver acordar linda, linda e jovem como sempre foi.
O dia de hoje merecia rotina. Merecia te ver sentada na mesa, com suas manias, no horário certo. Engraçado, vó, é que hoje eu tomei esse lugar pra mim. Involuntariamente e aos poucos, eu fui me acostumando a almoçar onde você almoçava. Onde eu sempre te via ao chegar da escola. Se tem algo que nos faz tanta falta é a tal da rotina. O dia merecia uma das mais pesadas e rígidas. Desde o acordar até o momento que você pendia a cabeça, cochilando na hora da novela. Merecia te ver levantar à tarde, depois da sesta, caminhar até a cozinha, pegar alguma fruta ou um café com bolachas e sentar no sofá da sala de estar. Nesse momento eu largava os meus estudos e me juntava a senhora. O dia de hoje merecia as nossas conversas e fofocas da tarde.
Saudades, vó. Saudades. Eu só queria dizer que eu sinto a sua falta. E que algumas datas são sempre maiores que outras. O seu aniversário, o dia da avó, o dia 14 de outubro, o natal, o meu aniversário. Todos os dias são maiores que outros. Todos os dias a saudade é maior que o dia anterior. Todo dia a dor diminui. Mas a cada abrir de olhos de manhã o meu amor cresce, a minha saudade se alimenta. O dia de hoje está repleto de memórias. De nostalgia. De lembranças marcadas pela rotina, pelo coloquial. E é por isso, é pelo amor na rotina que o dia de hoje merece homenagem. Merece saudade, também. Mas saudades já acontecem todos os dias.
Dani Fechine
Que lindo!!! Também sinto muita falta da minha avó, muita mesmo. Queria que ela estivesse aqui para que pudéssemos comemorar o dia dela, mas, certamente, eu iria comemorar todos os dias da minha vida se pudesse tê-la novamente. Parabéns pelo texto, ficou lindo de verdade ♥♥♥
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