02 setembro 2012

Você e um pouco mais

Sobre nós dois que tal os pratos limpos? Entreguemos as flores, secas ou não, com os espinhos que ficaram depois de uma cena inacabada numa terça-feira atordoada. Rasguemos os papeis de carta que foram entregues nas datas comemorativas ou não, escritos em letras de forma ou sem assinatura alguma. Sabe as fotos? Escondamos. De preferência na caixa mais funda do baú, uma dentro da outra, foto por cima de foto, viradas de cabeça para baixo e fechadas a sete chaves com aquele cadeado enorme que ficou guardado esperando utilidade. Peguemos as recordações pra jogarmos fora. Fora do nosso alcance visível, longe das nossas mãos e das nossas vontades de recuperar a lembrança do passado. Esqueçamos toda e qualquer forma de regressão psicológica que em um piscar de olhos nos remete ao início. Eu te peço que não me leia em momento algum. Não leia o meu rosto de pedindo para ir embora de vez e ao mesmo tempo te querendo para sempre. Não leia as minhas mãos nem os meus braços quando eles te abraçam e decidem demorar um pouco pra te soltar. Não leia as minhas palavras te dizendo para jogar tudo pra trás e seguir em frente. Não escute quando da minha boca pularem palavras que te façam ficar. Não me leia de forma alguma. Muito menos os meus passos retrógrados. Não preste atenção em mim. Não repare que eu ainda sou a mesma, que ainda tenho os mesmo sonhos de sempre ou que escrevo textos dos melhores porque você se torna protagonista. Não observe a minha forma te dizer "sim" quando é pra você, muito menos o meu sorriso quando eu te vejo no mesmo ambiente que o meu. Não perceba a minha fraqueza quando você me abraça e eu correspondo achando que tudo voltou. Não leia meus textos te pedindo pra não mais me olhar, te pedindo pra ir embora, te pedindo pra descobrir o caminho da sua vida. Não leia meus textos. Não quero ninguém se descobrindo em mim, não quero ninguém me olhando e me confundindo com um espelho. De reflexo já basta o seu quando falo de mim. Não acredite nas minhas palavras tão fortes assim. Não acredite que seja tão fácil não abrir o baú. Fácil mesmo é acreditar. Não encontramos o que estamos procurando simplesmente porque não sabemos o que procurar. Quando já temos o que queremos e não percebemos, são essas perguntas que se tornam recorrentes: o que você está procurando? Eu procuro não mais escrever você. Não mais transparecer o tédio que sou sem você. Não leia, por favor, meu eu sobre você. 

Dani Fechine

Um comentário:

  1. Esse é daqueles que termino a leitura com um PQP! Ficou muuuuito bom! (acho que foi um dos que mais gostei)

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"Aproveita que a melhor parte é de graça e feita com mais amor do que cabe em mim." (Tati Bernardi)