25 julho 2013

(amor) e ódio

Era uma terça-feira nebulosa, nublada, muitas nuvens e pouco céu. Em dias como esse andar pelas ruas frias da Irlanda parecia a alternativa mais óbvia e fria para Emily. Afinal, quem ela poderia encontrar numa cidadezinha pequena e "desconhecida" da Irlanda?
Gerry. Claro.
- Emily, o que faz aqui? (ele me perguntou um pouco menos assustado que eu).
- (Vim esvaziar a cabeça. De você. Escolhi esse vilarejo a dedo, como quem escolhe a melhor roupa para um jantar romântico [não sendo eu, claro]. Mas parece que você sempre me encontra e reencontra. Ou adivinha).
Ah, vim a trabalho, Gerry.
- E como você está, Em? Me parece que os últimos meses não foram tão fáceis. Ou foram diferentes, arrisco.
- (Não está nada bem. O mundo parece que desabou desde que você se foi, desde que você deixou aquele bilhete embaixo do abajur como se eu merecesse ver a sua letra ridícula e de quem estava com pressa, dizendo que não quer me ver sofrer. "Adeus". Era tudo que eu queria ouvir [muito menos ler] de alguém que viveu uma vida ao meu lado e depois como num acender/apagar de um abajur enferrujado desaparece sem mostrar a cara. Nem sequer uma mensagem de voz, uma ligação - que seria uma atitude um pouco menos estúpida. Foi muita covardia da sua parte. Eu queria dizer que você escolheu um dos piores dias para acabar com a mina vida. Se o senhor-artista-de-televisão-ocupado-com-as-garotinhas não se lembra, eu posso refrescar um poucos sua memória. Dia 6 de dezembro. Isso te lembra alguma coisa? Ah! Talvez fosse o meu aniversário ou quem sabe o NOSSO aniversário de mil anos de "estar juntos" (como você mesmo dizia em todos os cartões das flores meio murchas que sua secretária me mandava porque ela se lembrou disso, não você). Talvez você nem esperasse que eu chegaria em casa com alguma surpresa ou com algumas passagens para um vilarejo escondido na Irlanda. Talvez você não esperasse de mim o que eu sempre esperei de você. Talvez a Irlanda fosse fria demais ou monótoma demais ou pequena demais. Ou talvez eu fosse uma companhia um tanto chata. Porque até o abajur com sua lâmpada quase queimada teve a audácia e o privilégio de receber um bilhetinho dizendo que "acabou". Ele deve ter apagado e acendido as luzes algumas vezes numa rapidez que eu até imagino que você se assustou. Até porque você detesta assombração. Mas fica calmo, Gerry. Ele já estava meio ruim. Assim como eu também. E eu quero te pedir desculpa se eu me tornar uma assombração. Mas foi você que pediu distância. Eu fiz o máximo que eu pude. Atravessei o Atlântico e você nem notou. Você não é mesmo um homem que se possa ser digno dessa palavra, Gerry. Mas ainda assim, obrigada. Obrigada por me livrar de você. Estou vazia. Vazia dos sentimentos asquerosos que você expeliu em mim. Estou vazia e fria. Seca. É só uma pena você ter escolhido a pior maneira para isso. Foda-se. Você e o seu bilhete escrito na comanda do bar da esquina.)
Estou ótima, Gerry. Mas estou com pressa. Preciso ir, tenho uma pilha de livros para avaliar. A cidade é pequena, a gente e vê no bar mais próximo, não tenho dúvida. Bom te ver. Tchau!
- Tchau, Em. Saudades suas.
- (Canalha!) Então eu aceno e desapareço de vista. Pra sempre.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

"Aproveita que a melhor parte é de graça e feita com mais amor do que cabe em mim." (Tati Bernardi)