04 julho 2013

Era (quase) amor

Não foi a sua aparência meio destrambelhada, nem essa sua voz que ecoou dentro do cinema na fila da frente. Não foi o fato de você ter pisado na barra do meu vestido longo – o que me fez perceber que eles não precisam ser tão longos assim. Não foi (muito menos) esse teu jeito confortável, digamos assim, de se vestir. Foi o sorriso que você me deu achando que eu estava tão apaixonado quanto você por todas aquelas mentiras ficcionais do filme que a tela produzia. Você sorriu pra mim como se eu entendesse esse seu linguajar expressivo. Como se eu te conhecesse. Como se aquele lugar vazio ao seu lado fosse meu.

Não. Eu não amo filmes de ficção. Fico mais com as comédias românticas baseadas em fatos reais. Mas estava ali, porque eu até gosto um pouco de mentiras que são de mentiras. E uma coisa que você não sabe é que eu guardei aquele bilhete de entrada, porque nunca alguém havia sorrido daquela forma sem que eu pedisse ou ajudasse a fazê-lo. Foi o seu olhar sincero, achando que a gente se parecia em alguma coisa. Foi essa simplicidade ímpar que iluminava a sala. Pareceu-me amor. Mas era quase. Com certeza, com tanta bagagem de ficção científica, você não acreditava em amor a primeira vista, muito menos em destino. Mas eu, com meus romances e minhas histórias reais, estava esperando um cavalheiro (não um príncipe) descer de seu cavalo branco e pedir a minha mão. Você poderia ser esse cavalheiro. E poderia vir a pé mesmo, até gosto de caminhar um pouco.

Era uma espécie de empatia, de atração dos campos magnéticas ou atração cósmica. Era quase amor. Mas havia um pouco mais de mistério, curiosidade de desvendar o outro. Poderia, inclusive, ser apenas isso. Mas não. Olhares não se cruzam dessa forma e sorrisos não são compartilhados com frequência nessa sintonia. Poderia ser cuidado. Pressentimento. Intuição. Uma forma (meio complicada) de se comunicar. E tinha tantas poltronas vazias, porque tão distante? Não. Não havia de ser nada. Mas era. E não foi aquele filme chato que me fez pensar tanto. Aquelas lutas mais mentirosas do que ex-namorado. Aquela ficção fajuta. Foi a realidade que acontecia em frente à tela, que por sinal até se assemelhava a alguns dos romances que já li.

Foi por querer tanto que a sua sinceridade escapulisse, foi por querer tanto que fosse carinho (ou amor), que eu saí da sala antes das letrinhas finais. Saí como alguém que recebe uma ligação de emergência. Mas sem a ligação. Era urgente mesmo. Muito. Era amor. Quer mais urgência que isso? Fugi, corri, procurei o local mais escondido daquele cinema, porque amor, moço, é coisa séria, e no mínimo dá um medo tremendo. Deixei a sala antes das palmas, afinal, eu sabia que você iria esperar aquela cena depois dos créditos. E como toda mulher realista eu sabia que nenhum cavalheiro de armadura viria me seguir. Dito e feito. Nenhum cavalheiro de armadura resolveu me surpreender com suas “frases feitas e de efeitos” de contos de fadas. Mas você sim. E não adiantava mais fugir. Quando o coração da gente acelera, já era. Ou morre ou se entrega. E com uma vida tão longa pela frente, era melhor se entregar. Mas antes que eu falasse  que era amor e que o seu sorriso se encaixava no meu, você não pestanejou:  – Moça, é amor sim. Eu percebi quando eu te vi saindo com esse ar de desespero, com esse jeito de quem não quer sentir o frio na barriga novamente e com essa feição de quem sabe que se é amor, não adianta fugir. Moça, eu sei que é amor. O filme ainda não acabou, os créditos ainda não subiram e consequentemente a cena final ainda não apareceu. Mas eu vim aqui te entregar o livro que você deixou cair e te dizer que eu larguei os momentos finais do último filme da trilogia pra te dizer que a poltrona vazia estava sim reservada pra você. 

Dani Fechine

3 comentários:

"Aproveita que a melhor parte é de graça e feita com mais amor do que cabe em mim." (Tati Bernardi)